em casa

lavínia

A gente sai do hospital com um filho nos braços, o título e a alma de mãe, uma vontade imensa de acertar e o comportamento de quem ainda tem chão pela frente.


Existe um processo de se tornar mãe. E ele não acontece no parto.


Antropólogos o chamam de matrescência.


Eu não sei nem descrever o quão maravilhoso foi encontrar essa palavra.


A psiquiatra Alexandra Sack diz que não é por acaso que a palavra matrescência se parece tanto com adolescência. Ambos são períodos de mudanças dramáticas no corpo, nos hormônios, nos sentimentos, na maneira como nos enxergamos e processamos emoções. A diferença é que todos sabem que a adolescência é intensa e difícil.


Não temos o mesmo olhar quando o assunto é se tornar mãe.


Carregamos expectativas irreais. Recebemos o recém-nascido achando que o instinto saberá de tudo e que o desejo de colocar as necessidades do bebê em primeiro lugar será constante.


Só quem já ficou acordada por noites e noites entende que não é bem assim. Conhece o impasse interno. Somos todas mães e vocês sabem do que estou falando.


Na matrescência, as pessoas esperam que você aja com maturidade, que encare serena o abrir mão do controle da própria vida, do ritmo, do mundo como conhecia.


Mas não é tão simples. A Dra. Alexandra descreve como um “empurra e puxa.”


A ocitocina, hormônio que aumenta cada vez que você carrega, beija e cheira o seu bebê, avisa o cérebro que isso é amor. E que é dos grandes, te alertando sobre a importância daquele serzinho na sua vida.


Por outro lado, nessa mesma mente, há lembranças recentes da vida como ela era. Da identidade que você levou anos e anos para construir e da segurança que isso traz. Do cotidiano, dos relacionamentos, das coisas que, de forma abrupta, abriu mão.


É uma luta real, não é hipotética. Sua com você mesma. Exige humildade, coragem, resiliência. E tempo. Sempre ele, o tempo.


Trazer um mãe ao mundo é tão desafiador quanto cuidar de um bebê. Agora imagine fazer os dois simultaneamente.


Isso é matrescência.


É entrar em uma nova realidade. Um lugar em

que cabe a mulher, em que cabe a mãe e em que nasce o doce espaço onde elas se misturam.


Autora: @rafaelacarvalhoescritora