gestante

ísis

O bebê chega, e o pequeno senso de controle em relação a vida se vai. 


A incógnita dos dias foi um desafio ainda maior do que o dormir pouco. 


A verdade é que, apesar de não ser apegada a horários e agendas, perder os rituais da vida bagunça a saúde mental de qualquer pessoa.


Não saber se a soneca será longa o suficiente ao ponto de te deixar lavar os cabelos semitranquila (não tão nervosa, com bebê chorando ao fundo, nem tão calma, sem choros imaginários na sua cabeça).


Não saber se a felicidade no tapetinho colorido durará o tempo de tomar um gole de café na xícara favorita (aquela que encaixa direitinho na mão), hábito que carrega há anos.


Ter a ligação interrompida. E a ideia, a tarefa, a refeição, a conversa, e o cocô de um intestino que, cá entre nós, nunca foi dos mais eficientes.


Eu questionava até as minhas roupas. Não pela cobrança de servir, mas porque as vesti por tantas temporadas. Elas faziam parte de quem era.


Eu já não sabia dizer se aqueles trajes me cabiam, e nada tinha a ver com tamanho. 


Os dias são grandes pontos de interrogação, e ironicamente sabemos exatamente onde vamos estar (em casa) e o que estaremos fazendo (amamentando, trocando, ninando). 


O ritmo da minha existência se perdeu para que a de outro pudesse se encontrar. 


Só que dar adeus às coisas que confirmam ao cérebro que você, é você, machuca.


E embora muitos dos desafios sejam temporários (o bebê cresce e sua independência física e emocional também), o se reinventar é uma missão que fica.


É fundamental reconhecer a hora de recolocar as mãos no próprio leme.


O nascimento da nova mulher, que chega depois da mãe, vem de um parto muito mais longo. E com uma anestesia de duração tão longa que dói.


Um caminho desafiador, mas necessário. Já que viver fora de si tem um preço. E custa caro. 


Um dia, ao me olhar no espelho, observei que há muito tempo não me enxergava como antes. E que nunca na vida, me vi tão eu.


Autor: @rafaelacarvalhoescritora